Luiza Mendonça Paixão – Engenheira na Reta Engenharia*
No cenário atual em que a Engenharia e Construção estão em constante evolução, o Building Information Modelling (BIM) surgiu para alterar a maneira como concebemos, edificamos e supervisionamos as obras de infraestrutura. O BIM aplicado para infraestruturas permite uma compreensão abrangente dos projetos, integrando informações de todas as disciplinas envolvidas. Em vez de idealizar a infraestrutura em componentes isolados, o BIM adota uma visão integrada, em que cada elemento é interconectado, resultando em uma representação mais fiel e precisa do empreendimento.
Dessa forma, para o desenvolvimento de um projeto de infraestrutura do início ao fim, devem ser contempladas diversas etapas na sua elaboração: organização do projeto, escolha do CDE (Ambiente Comum de Dados), concepção do traçado, modelagem, orçamento, planejamento, gestão de ativos e plano de manutenção.
Todo o projeto deve ser produzido seguindo os conceitos da ISO 19.650 (Organização da Informação da Construção – Gestão da Informação usando Modelagem da Informação da Construção), norma internacional cujo objetivo é estabelecer princípios e requisitos para a Gestão da Informação durante o andamento de um projeto de edificações e infraestruturas, tendo como base a metodologia BIM. A ISO 19.650 é dividida em 5 partes, sendo:
• Parte 1 – Conceitos e princípios gerais.
• Parte 2 – Fase de entrega de ativos.
• Parte 3 – Processos de desenvolvimento e gestão da informação durante a fase de construção.
• Parte 4 – Troca da informação.
• Parte 5 – Requisitos de segurança da informação.
Plano de Execução BIM
O primeiro passo para o projeto deve ser a criação do Plano de Execução BIM (BEP). O BEP é gerado a partir do EIR (Requisitos de Troca de Informação), arquivo geralmente enviado pela Contratante, o qual apresenta as informações e premissas do escopo. Em resumo, o Plano de Execução BIM é um documento central que guia sua implementação. Ele estabelece diretrizes para padronizar práticas ao longo do ciclo do projeto, indica as funções, responsabilidades, estratégias e entregas.
Além disso, deve ser definido no BEP um padrão de nomenclatura baseada no glossário da ANTT e um fluxo de documentação para compartilhamento e aprovação dentro do CDE. O Plano de Execução BIM é atualizado conforme o projeto vai sendo desenvolvido. A plataforma “Plannerly” pode ser uma escolha positiva no desenvolvimento do BEP, uma vez que apresenta templates baseados na ISO 19.650.
CDE (Common Data Environment)
A escolha do CDE é de grande importância, uma vez que será o local onde toda a informação será armazenada, compartilhada, gerenciada e aprovada. É um ambiente colaborativo para as equipes, que garante a consistência dos dados ao longo do ciclo de vida do projeto. As plataformas mais comuns de CDE são: Autodesk Construction Cloud, Trimble Connect, BIMSync Catenda Hub, etc.
Desenvolvimento do Projeto
O desenvolvimento do projeto deve seguir as etapas detalhadas abaixo:
- Modelo Digital do Terreno (MDT)
- Projeto Geométrico
- Projeto de Terraplenagem
- Projeto de Drenagem
- Projeto de Obra de Arte Especial (OAE)
- Planejamento 4D
- Orçamento 5D
- Virtual Design Construction (VDC)
- Plano de Manutenção e Conservação
Modelo Digital do Terreno
O Modelo Digital do Terreno (MDT) é gerado através da coleta de dados topográficos, utilizando tecnologias como levantamentos aéreos, drones ou equipamentos terrestres. Esses dados são processados para criar representações precisas da superfície terrestre, incluindo detalhes como elevações, relevos e características geográficas, proporcionando uma visualização tridimensional do terreno. Geralmente esse arquivo é enviado pela Contratante antes do projeto ser iniciado.
São utilizados softwares com o objetivo de gerar a superfície para análise do terreno e definição do melhor traçado da rodovia. O Autodesk Civil 3D (com adição do Country Kit Brazil) é comumente utilizado para essas análises.
Dessa forma, as principais análises geradas são:
• Análise de Elevações: obtém-se os limites de elevação máximo e mínimo do terreno de estudo.
• Análise de Declividades: obtém-se os limites de declividade máximo e mínimo do terreno de estudo.
• Análise de Perfis: tem como objetivo observar como é a progressão do terreno, desníveis e topografia.
• Análise de Setas de Declividades: observa-se o sentido das águas na área de estudo, de modo a propor um traçado que tenha o cuidado de definições de terraplanagem que não resultem em problemas posteriores para a criação de estruturas de drenagem.
Estudo de Alternativas
A definição do melhor traçado para uma rodovia deve levar em consideração as premissas e parâmetros da Contratante, assim como demais informações da região, áreas de preservação ambiental, nascentes, cursos d’água, construções existentes e pontos de passagem obrigatórios. Além disso, com as análises geradas a partir do MDT, é possível classificar o tipo de rodovia que será predominante e suas características (classe, raio mínimo, percentual de rampa máxima etc.).
Também deve-se levar em consideração os volumes de corte e aterro, sempre buscando um balanço de massa equilibrado. Para gerar o traçado, é utilizado o software Autodesk Infraworks, conforme figura abaixo:
Projeto Geométrico
Para a elaboração do Projeto Geométrico, é exportado o arquivo “.imx” do Autodesk Infraworks para o software Autodesk Civil 3D (C3D). No C3D são corrigidas as discordâncias encontradas de acordo com a classe da rodovia e propriedades inseridas de acordo com o template utilizado.
Após a correção das inconsistências no perfil horizontal da rodovia, é definido o perfil transversal. Para essa definição, é utilizada a configuração de “Assembly” para todo o alinhamento e este é alterado em suas “subassemblys”, que são divisões do perfil completo, como o acostamento, a pista e os taludes, entre outros. As “subassemblys” devem ser modificadas para atender ao padrão de projeto escolhido (DNIT, DER, etc.).
Posteriormente são atribuídas “labels”, que funcionam como etiquetas de identificação das estacas, superelevações, pontos de início e fim de curvas. São geradas as pranchas com as notas de serviço, que fazem a divisão da rodovia em trechos, apresentando as seções verticais transversais.
Projeto de Terraplenagem
A partir do Projeto Geométrico é possível gerar a superfície de projeto, em que são realizadas análises e simulações. De acordo com o estaqueamento da rodovia, são definidos os volumes de corte e aterro a partir do comando “Compute Materials”. Esse comando faz o cálculo automático, levando em consideração a diferença de volume entre a superfície natural do terreno e a superfície gerada pelo corredor da rodovia.
Projeto de Drenagem
Para o desenvolvimento do Projeto de Drenagem, primeiramente é realizado um estudo hidrológico da região, para avaliar os parâmetros de chuva (intensidade, duração e frequência). É utilizado o software Autodesk Infraworks para a delimitação das bacias de contribuição. Posteriormente, a informação é exportada para o Autodesk Civil 3D, de forma a realizar o ajuste das áreas de influência dos bueiros. O dimensionamento dos bueiros pode ser feito no “Hydraflow Express Extension”, ferramenta do Autodesk Civil 3D. Além dos bueiros, são modeladas as sarjetas padrão MFC 01 do DNIT e as entradas para descidas d’água.
Concluídas as modelagens dos dispositivos de drenagem, os sólidos são exportados em um arquivo separado, preparando o documento para a integração posterior do modelo com outras disciplinas.
Projeto de Obra de Arte Especial (OAE)
O Projeto de Obra de Arte Especial pode ser desenvolvido no software Autodesk Revit, utilizando premissas informadas pela Contratante e de acordo com o vão deixado pelo Projeto Geométrico.
Para realizar a compatibilização com o Civil 3D, primeiramente devem ser obtidas as coordenadas X, Y e Z e a rotação de um ponto escolhido na extremidade do vão entre os dois pavimentos da rodovia. Depois, é inserida a coordenada e a elevação entre as 2 pontes na planta da Superestrutura, no Revit. Em sequência, deve ser utilizado o comando de “especificar coordenadas no ponto” de forma a trazer as coordenadas do Civil 3D para o Revit. Deve ser feito o cálculo para converter a rotação de graus para minutos. Concluída a compatibilização de coordenadas, o arquivo em Revit é exportado como IFC. O arquivo em IFC da ponte será aberto no Civil 3D na posição e rotação correta da estrutura.
Para realizar a extração de quantitativos, são alteradas as famílias das estruturas de forma a inserir os parâmetros: taxa de armadura, cálculo de área de forma, cálculo de volume de concreto, cálculo de quilogramas de aço, etc. A extração das tabelas para uma planilha em Excel pode ser feita utilizando o plug-in DiRootsOne.
Planejamento 4D
Para o Planejamento 4D, deve ser utilizada alguma plataforma de planejamento, como o Microsoft Project ou Project Libre, juntamente ao Autodesk Navisworks.
A partir da estrutura analítica desenvolvida e com as durações estimadas, é desenvolvido um cronograma que será exportado para o Navisworks. No Navisworks são incluídos e federados todos os modelos elaborados, para análise e obtenção dos “Clashs”, que são os pontos de interferências entre as estruturas.
O cronograma é importado para o Navisworks e é criada a EAP dentro dos “Sets” e feito o link com a EAP do cronograma. É possível simular o andamento da execução com a ferramenta “Time Liner”.
Orçamento 5D
O software da AltoQI, Visus, é muito utilizado para a elaboração do orçamento 5D, sendo uma plataforma que consegue integrar as dimensões tradicionais de tempo e custo com detalhes visuais, como a modelagem 3D. O Visus extrai os quantitativos dos projetos de maneira automatizada e paramétrica.
Os arquivos em IFC dos modelos de cada disciplina são importados para o Visus, e cada item da Planilha de Quantidades é associado a um elemento do Modelo Federado. Sendo assim, o orçamento se torna mais confiável e a informação mais rastreável.
*Luiza Mendonça Paixão é Engenheira na Reta Engenharia com título de Mestre em Gerenciamento de BIM para Infraestrutura, Engenharia Civil e GIS pela Zigurat Institute of Technology. Trabalha nas áreas de gerenciamento de projetos, elaboração de orçamentos e planejamento para contratos de engenharia e execução de obras de infraestrutura e industriais. A conexão que apresenta com o BIM é por meio da gestão de projetos elaborados utilizando a metodologia e com o Planejamento 4D.
Referências Bibliográficas:
IMAGENS: imagens retiradas da apresentação final do Mestrado do Grupo 03 – InfraBIM – ZIGURAT Institute of Technology e Universidade de Barcelona
BIME INICIATIVE. BIM Dictionary. Disponível em: <https://bimdictionary.com/en/common-data-environment/2>. Acesso em: 19 fev. 2024.
BIME INICIATIVE. BIM Dictionary. Disponível em: < https://bimdictionary.com/en/bim-execution-plan/2>. Acesso em: 19 fev. 2024.
Autodesk Civil 3D. Versão 2023. Disponível em: (http://www.autodesk.com.br).
Autodesk Revit. Versão 2023. Disponível em: (http://www.autodesk.com.br).
Autodesk Infraworks. Versão 2023. Disponível em: (http://www.autodesk.com.br).
Autodesk Navisworks. Versão 2023. Disponível em: (http://www.autodesk.com.br).
Plannerly™ The BIM Management Platform™ SmartLeanBIM® ©2023. Disponível em: (http://www.app.plannerly.com).
Catenda HUB. Disponível em: (http://www.bimsync.com).
DNER. 1999. Manual de Projeto Geométrico de Rodovias Rurais. Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, atual DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. (https://www.gov.br/dnit/pt-br/assuntos/planejamento-e-pesquisa/ipr/coletanea-de-manuais/vigentes/706_manual_de_projeto_geometrico.pdf)